quarta-feira, 28 de maio de 2014

Cartas a um jovem poeta - trecho

"Os Homens possuem, para todas as coisas, soluções fáceis e convencionais, as mais fáceis das soluções fáceis. Entretanto, é evidente que sempre se deve preferir o difícil: Tudo o que vive lá cabe. Cada ser se desenvolve e se defende a sua maneira e tira de si próprio, a todo custo e contra todos os empecilhos, essa forma única que é sua. Conhecemos muito poucas coisas, mas a certeza de que devemos sempre preferir o difícil, nunca nos deve abandonar. É bom ser só, porque a solidão é difícil. Se uma coisa é difícil, motivo mais forte para a desejar. Amar também é bom, porque o amor é difícil. O amor de um ser humano para outro, é talvez a experiência mais difícil para cada um de nós, o mais superior testemunho de nós próprios, a obra absoluta em face da  qual todas as outras são apenas ensaios. É por isso que os seres bastante novos, novos em tudo não sabem amar e precisam aprender. Com todas as energias do seu ser , reunidas no coração que bate inquieto e solitário, aprendem a amar. Toda aprendizagem é uma época de clausura. Assim, para o que ama, durante muito tempo e até durante a vida, o amor é apenas solidão, solidão cada vez mais intensa e mais profunda. O amor não consiste em uma criatura se entregar, se unir a outra logo que se dá o encontro. (Que seria a união de dois seres vagos, inacabados, dependentes?) O amor é a oportunidade única de amadurecer, de adquirir forma, de nos tornarmos um universo para o ser amado. É uma alta exigência, um desejo sem limites, que faz daquele que ama um eleito solicitado pelos mais largos horizontes. Quando o amor aparece, os novos apenas deveriam nele o dever de trabalharem em si próprios. A capacidade de nos perdermos noutro ser, de nos entregarmos a outro ser, todas as formas de união, ainda não são para eles. Primeiro, é preciso ajuntar muito tempo, acumular um tesouro. Nisto consiste o erro tão corriqueiro e tão grave dos novos: Precipitam-se quando o amor os atinge, porque faz parte do seu temperamento não saberem esperar. Entregam-se quando o seu espírito é apenas esboço, inquietação, desordem. Mas que? que pode fazer a existência desta confusão de materiais desperdiçados a que denominam "a sua união" ? E que futuro podem aguardar? Cada um se perde a si mesmo por amor do outro e perde também o outro e todos aqueles que ainda poderiam chegar... E cada um perde o "sentido do que é amplo" e os meios para alcançar, cada um troca os vai e vens das coisas do silêncio, repletos de promessas, pela confusão estéril de que só pode sair tédio, indigência e desilusão. Só lhes resta refugiarem-se numa dessas várias convenções que existem em toda parte como abrigos ao longo de uma vereda perigosa."

-Rainer Maria Rilke

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